terça-feira, 2 de junho de 2015

Redução da maioridade penal é a solução?

         Ha algum tempo assistimos adolescentes participando ativamente em crimes violentos.
        A situação piora a cada dia.
        A reação das instituições publicas, frente a esse desafio, restringe-se a prendê-los e encaminhá-los a uma Instituição, onde deveriam se submeter a medidas sócios educativas, como preconiza o Estatuto da Criança e Adolescente.
A policia cumpre sua parte. Prende-os.
Mas, as Instituições responsáveis pelo cumprimento das medidas sócio educativas, são incapazes de receber esses jovens e corrigi-los.
Claro, há exceções.
Mas, o que se vê é que em pouco tempo, esses jovens saem das Instituições e continuam praticando crimes.  
Agora discute-se no Congresso a redução da maioridade penal.
Mas, será que essa é a solução?
Pesquisei e encontrei um texto de Vinicius Bandera, Pós-doutorando em História Social (USP), Doutor em Sociologia (UFRJ), Mestre em Ciência Política (UNICAMP), que aborda essa problemática.
Vou procurar resumir.
Explica-nos o autor que ao longo da história, os menores ficavam sob a ação direta da polícia, que se encarregava de levar para a delegacia tanto os menores abandonados quanto os menores delinqüentes.
Na delegacia, esses adolescentes submetiam-se a uma triagem para terem um destino de acordo com a situação de cada um.
Triagem essa que, não raramente, estava condicionada ao subjetivismo das autoridades policiais, ainda mais se considerarmos que àquela época o respeito aos direitos humanos era bem menos protegido do que é atualmente.
Como conseqüência da triagem uns ficavam presos à espera de julgamento e outros libertos, de volta às ruas.
Esses libertos eram entregue aos responsáveis, ou a instituições governamentais, principalmente para internação em escolas militares de aprendizes, ou a instituições assistenciais, principalmente da Igreja Católica.
Nessas instituições eram encaminhados para empregos no comércio, na indústria, na área rural, e mesmo a particulares, sob o regime de soldada, que é uma espécie de adoção sob regime de emprego, geralmente doméstico. Além de outros destinos menos cotados.
A quase totalidade desses menores era de origem pobre ou miserável, geralmente oriundos de famílias incursas em ambientes de marginalidade, nos quais vigoravam os chamados maus costumes, os hábitos "viciosos", enfim o mundo da desordem.
Ser menor abandonado era uma espécie de rito de passagem para se chegar a ser um menor delinquente, embora somente uma minoria dos menores abandonados chegasse a delinquir, no sentido de conflitar com a lei.
Como decorrência do avanço civilizatório modernizador capitalista e do agravamento do problema menores abandonados e delinquentes, surgiu o Código de Menores, sancionado em 1927.
O Código se apresentava como sendo uma lei para todos os menores, independentemente de  condições sociais, étnicas e  ideológicas  dos menores e/ou de seus familiares.
Não obstante, na prática, seus "clientes" mais frequentes eram os menores de antes: pobres ou miseráveis, com baixa ou nenhuma escolaridade, oriundos de lares e ambientes imersos no mundo da desordem, negros ou mestiços em sua maioria. 
O Código, malgrado com o tempo ter-se tornado anacrônico, era uma lei avançada para a época, no que tange a proteger e/ou corrigir os menores de idade.
Acontece que como no caso do futuro Estatuto da Criança e do Adolescente, não se muda a realidade por decreto.
O que implica dizer que o problema menores abandonados e delinquentes atravessou décadas, à revelia do Código de Menores, vindo a transformar-se nos  atuais problemas crianças e adolescentes em risco social e adolescentes em conflito com a lei.
Problemas estes que  suscitaram a necessidade de uma nova lei, representada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que, a despeito de ser bem mais favorável à causa infanto-juvenil do que fora o Código de Menores, também tem sido insuficiente em mitigar substantivamente a triste realidade de grande parte de crianças e adolescentes enquadrados em seus artigos.
Isto devido principalmente a que, como no período de vigência do Código, a realidade, na qual qualquer  lei se inscreve, não sofreu alterações significativas que viessem  a possibilitar  uma maior aproximação com os preceitos do ECA.
Por outro lado, na esteira da modernização industrializadora, o Brasil foi conduzido a um grande salto em termos de desenvolvimento econômico e tecnológico.
No entanto, tratava-se de um desenvolvimento concentrador de  riquezas, que trouxe um incremento de densidade populacional para as cidades mais desenvolvidas.
Sobretudo as do sudeste, acometidas de seguidos êxodos rurais, que sobrecarregavam a capacidade urbana de atender a essa demanda excedente.
Faltavam serviços públicos como saúde, educação, saneamento básico, entre outros.
Faltavam empregos e moradias, levando muitas famílias a não terem outra opção senão ocupar áreas sem estrutura habitacional adequada, como as favelas, que se desenvolviam em extensão, desordem urbanística, número de habitantes e marginalidade e criminalidade.
Todo esse quadro estrutural atingia diretamente a questão do menor, que, desde sua origem, em meados do século XIX, esteve associada, em grande parte, à desigualdade social, que persistia como um problema crônico.
No plano ideológico, a política do menor  seguia  tendo  considerável  porção  do  viés  cientificista de indigitar o menor como alguém fora da ordem, portanto  merecedor  de correção.
Não  se  aventava  a lógica  de  que a correção deveria passar  por  responsabilizar o Estado em garantir para todas as crianças e  adolescentes, independentemente de condição social ou étnica, os três lotes: cívico, político e social de direitos básicos indicados por Marshall  como componentes da cidadania liberal.
A lógica continuava a ser responsabilizar o menor por sua “culpa” de  se  encontrar  marginalizado, concedendo-lhe  a  correção  como  forma  de  seu adestramento social.
Também continuava o papel hegemônico do Estado em dirigir a política do menor.
Concluindo o problema social envolvendo crianças e adolescentes em risco social e adolescentes em conflito com a lei segue em um estado de extrema gravidade.
As razões para tal gravidade estão na continuidade do alto nível de desigualdade social que marca a sociedade brasileira, na influência perniciosa da indústria cultural em forjar valores e comportamentos baseados no individualismo possessivo, na deficiência escolar, sobretudo em se tratando de escola pública de ensino básico, em não educar os alunos para o fortalecimento de uma consciência crítica diante do mundo em que estão inseridos, além de fornecer-lhes uma educação de baixa qualidade em termos de disciplinas curriculares, e na deficiência, não menos grave do que a escolar, dos dispositivos estatais em educar os adolescentes cumpridores de medidas socioeducativas.
 Finalmente, a razão provavelmente de maior gravidade, por estar na raiz do problema, é a incapacidade de muitas famílias em educar suas crianças e adolescentes de modo a prevenir que elas entrem em situação de risco social, o que contribui de forma bastante acentuada para que sejam futuros agentes de conflitos com a lei.
Tal incapacidade decorre do fato de essas famílias estarem acometidas de alguns dos males, ou até todos, que acometem seus filhos e não contarem com apoio suficiente de organizações governamentais e/ou não-governamentais que lhes deem subsídios suficientes para desenvolverem uma consciência critica e uma condição material capazes de proteger a si a seus filhos.

Não atacando essas fontes principais de fatores de risco, de modo a fazerem serem vencidos por fatores protetivos, a tendência é que os problemas crianças e adolescentes em risco social e adolescentes em conflito com a lei prossigam no mesmo diapasão de então ou até venham a se agravar, a despeito da vigência de uma  lei bem qualificada do ponto de vista protetivo/corretivo e da diligência de uma multiplicidade de projetos, organizações e agentes bem intencionados em mitigar ambos os problemas. 

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