sábado, 12 de julho de 2014

Uma experiencia bio desagradavel - capitulo XXIX

Capitulo XXIX – A saída definitiva da UTI

Naquela noite sonhei que estava numa praia.
Era um lugar conhecido. Achei que era o Guarujá. Mas estava diferente.
Eu dirigia um carro por uma estrada na parte alta de uma montanha, que beirava a costa do mar.
Vi uma placa indicando acesso para uma praia.
Parei o carro no acostamento e desci. Fui caminhando ate um local onde era possível ver a paisagem lá embaixo.
Observei que havia baias e enseadas, que nunca observara antes.
Resolvi caminhar por uma trilha na montanha que acessava uma dessas baias.
Entrei no mar. Fui caminhando pelo mar, que era raso, até a outra borda. A água ficava na altura do meu joelho.  
Estava um sol forte. Fazia muito calor.
Voltei para o carro. Entrei nele e percebei que estava diferente.
Tinha dificuldade em dirigir.
Segui por uma estrada e vi uma estação de embarque para uma balsa.
A balsa ligava aquele local, que era uma ilha, ao continente. Dava para ver o outro lado. Parecia um canal. A distancia era curta. O mar estava tranquilo. Entrei na balsa a pé e imediatamente estava do outro lado.
Na outra margem, quando desci, entrei num outro carro.
Segui dirigindo por algumas ruas estreitas, que me pareceram ser a cidade de Santos, na parte velha.
De repente estava na estrada Anchieta que liga São Paulo a Santos.
Subi a serra. Chegando ao planalto resolvi voltar. Fiz o retorno em uma praça de manobras. Desci a serra novamente. Tinha muita curva.
Chegando a Santos, resolvi fazer a travessia até Guarujá, por barco. A distancia parecia maior.
Entrei em um barco de popa. O mar estava muito agitado. As ondas estavam muito altas e quando quebravam no barco e espalhavam espuma pelo ar.
Fiquei com medo que o barco afundasse e eu morresse afogado.
Chegando ao porto do Guarujá, subi pelo píer. Era uma passarela de madeira.
Vi um veleiro ancorado próximo ao porto. Resolvi ir ate ele. Voando.
Dei um salto, abri os braços, como se fosse uma asa, estiquei as pernas para trás e comecei a voar.
Essa técnica de voar eu já tenho há muito tempo. Às vezes preciso subir em uma escada e saltar. Desta vez não foi preciso. Havia um pouco de vento e isso me ajudou.
Voei até o veleiro. Circulei em torno do veleiro, mas um marinheiro disse que não poderia entrar.
Como precisava me impulsionar, novamente, para o voo, utilizei o vento que vinha em minha direção para planar. Fui levado até uma praia e pousei em pé, na areia.
Comecei a caminhar. Procurava por minha mulher, mas não a encontrava.
A praia estava com muita gente.
Entrei no mar, que estava agitado e com correnteza. A correnteza me levou para distante de onde estava.
Sai do mar e na areia caminhei até um prédio na orla. Entrei.
La dentro havia uma agitação de pessoas andando de um lado para o outro, havia garçons carregando comida. Escutava muito barulho de pratos batendo um contra o outro.
Acordei.
Vi que alguns enfermeiros estavam iniciando a higienização. Outros serviam comida para alguns pacientes.
- E o meu café da manhã? - perguntei a uma enfermeira que estava próxima de mim.
- Não tem café da manhã para o senhor.
- Como não?
- O senhor não pode.
- Posso sim. A médica me liberou ontem à noite.
- Não estou sabendo. O senhor tem certeza?
- Sim. Claro que tenho.
- Eu não estou sabendo.
Fiquei aborrecido com o fato de não me incluírem entre os pacientes que receberiam refeição.
- Não é possível! Faz o seguinte. Por favor. Você poderia chamar a enfermeira chefe? Ela deve saber. Por favor, chame ela. – disse 
Ela aquiesceu e saiu em direção a sala da enfermeira chefe. Depois de um tempo voltou acompanhada pela enfermeira chefe de plantão.
- Então, senhor José, tudo bem com o senhor?
- Sim.
-  Ela me contou - disse apontando para a enfermeira -  que o senhor disse que já está liberado para comer. 
- Sim, é verdade.
- Que bom, não é? Deixa eu dar uma olhada em  seu prontuário.
Ela pegou uma prancheta que ficava na cabeceira da cama e olhou.
- Olha, senhor José, o senhor está liberado, sim. Mas, para comida pastosa.
- Pastosa. Liquida. Para mim o que vier está ótimo. Comida é tudo a mesma coisa,
- Não, não é. O senhor está liberado apenas para comida pastosa.
- E suco? Posso beber? Quero um suco de laranja.
- Não. O senhor não pode beber suco. Se o senhor beber liquido pode engasgar.
- Eu engulo saliva e não engasgo. Quer ver?
E engoli a saliva.
- Eu sei, mas é diferente. Vou ver o que encontro para o senhor. A cozinha não mandou nada.
- Estou morrendo de fome.
- Calma. Eu vou ver e já volto.
- Enquanto isso, posso beber água?
- Pode. Mas, só um copo. Devagar para não engasgar.
A enfermeira chefe virou-se para a auxiliar de enfermagem e disse:
- Por favor, pegue um copo de água para o senhor José.
A enfermeira chefe saiu. Depois de algum tempo voltou trazendo um mingau. Colocou com em uma bandeja de cama e pôs sobre minhas pernas. Experimentei. Achei o gosto horrível.
- E ai, senhor José, está bom?
- Não! Não gostei. – disse fazendo careta de repugnância.
- Tome. Está gostoso.
- Não! Não quero.
- Senhor José, o senhor só pode tomar mingau, que é pastoso. Tome. Está gostoso.
- Deixa eu dizer uma coisa para você.  – disse irritado. - Eu não estou mais em idade de tomar mingau. Isso eu tomava quando era bebe. Eu não vou tomar essa porcaria. Pode tirar daqui. Está horrível.
- Senhor José, o senhor não pode comer qualquer coisa. O senhor está em recuperação.
- Eu quero uma fruta. Não posso comer uma fruta? Uma banana..uma banana amassada. É pastosa. Uma maçã raspada. Mamão papaia batido. Sei lá. É pastoso. Qualquer coisa. Mingau... eu não tomo. Está muito ruim.
- Está bem, senhor José, vou ver se acho uma fruta para o senhor.
Ela novamente saiu e algum tempo depois voltou trazendo duas porções de mamão papaia cortado em pedaços pequenos, embaladas em uma caixinha de plástico para viagem.
- Senhor José. – disse ela. - Coma bem devagar. Mastigue muito bem antes de engolir. Engula um pouquinho de cada vez. Sem pressa.
- Está bem.
Peguei uma colher e comecei a comer o mamão. Como estava maduro, derretia na minha boca. Comi tudo com muito prazer.
Pensei: Que delicia!
- Quero mais. – pedi.
- Olha, senhor José, acabou. Na hora do almoço o senhor come mais.
- Eu acho que estou com hipoglicemia. Estou um pouco tonto. Preciso comer mais.
- Senhor José – disse a Dr.a Kátia intervindo – se o senhor estiver com hipoglicemia eu vou ter que mandar aplicar uma injeção de glicose no senhor.
- Não! Não precisa. Um pouco mais de mamão basta. Só mais uma porção.
- Enfermeira, faça o destro agora, no senhor José, por favor.
- Destro? O que é isso. – perguntei.
- É teste de glicemia. – respondeu ela.
- Então faz o canhoto. – brinquei dando a mão esquerda para que ela colhesse sangue de meu dedo.
A enfermeira fez o teste e mostrou o resultado para a Dra. Kátia. Eu estava com o nível de glicose em oitenta e quatro.
- Olha, senhor José, o senhor não está com hipoglicemia, não. Está é com manha. 
Aquele final de semana passou tranquilo.
Na segunda feira estava ansioso para sair. 
Aguardava a chegada da Dra. Kátia para me liberar. 
Um pouco antes disso, apareceu uma enfermeira toda sorridente, um tanto espantada, disse para mim:
- O senhor por aqui?  
- Sim.
- Como eu estou contente em ver o senhor tão bem. O senhor não vai acreditar, mas é verdade. Quando sai de férias, há quinze dias atrás, o senhor estava tão mal. Tão mal. Eu achei que o senhor não sobreviveria. Verdade. O senhor estava mal mesmo Que bom em ver o senhor tão bem. Puxa vida, que alegria. Estou tão feliz!
Ela, realmente, demonstrava estar feliz por me ver.
Pensei: De que essa doida está falando?  Nunca fiquei mal.  Mal, assim a ponto de quase morrer. Estava só me recuperando. Ela é doida. Ou deve estar me confundindo com outra pessoa. Sei lá.
O fato é que ninguém havia me contado, até então, que eu passara pelo que eu passei. Eu não sabia de nada. Para mim, eu estava internado na UTI sem entender exatamente o por que. Ora achava que era em razão da demora da minha convalescência. Ora achava que era porque a Dra. Kátia ganhava uma porcentagem do custo da minha permanência na UTI. Estava confuso sobre as razões. Mas, nunca achei que estivesse mal. 
Finalmente, a Dra. Kátia chegou.
Imediatamente perguntei sobre a minha saída. Ela respondeu que ainda não era a hora, pois ela queria ter certeza de que não havia mais problemas em meu pulmão.
Disse que solicitara um ultrasom do meu pulmão e que somente após o resultado ela decidiria.
Passou o dia inteiro, mas nada de aparecer o ultrasom.
Chegou a noite.
Dra. Kátia estava saindo para ir embora, quando perguntei:
- Doutora Kátia. Oi doutora Kátia.
Ela parou sua caminhada, virou-se para mim e disse:
- Sim, o que é?
- Então, doutora Kátia... eu não ia embora hoje?
- Hoje não.
- Como assim?
- Eu já falei para o senhor que enquanto eu não tiver o resultado do seu ultrasom, o senhor não sai. O senhor vai ter que esperar mais um pouquinho... Tenha paciência, senhor José. O senhor já esperou tanto.
- Quero sair logo.
- Eu sei. Todo mundo quer. Tenha calma. 
- Mas, por que a demora?
- Eu não sei. Não sei o que aconteceu para que eles não tenham vindo até agora.
- Mas, eles não tinham que vir?Então?
- O senhor viu quantas vezes eu pedi para eles virem. Devem estar cheios de serviço. Aguarde até amanhã. Tenha calma. Boa noite.
Ela virou-se e foi-se embora.
Fiquei transtornado. Contava com a saída da UTI naquele dia. 
Chamei a enfermeira várias vezes durante a noite para cobrar a vinda da equipe que realizaria o exame do ultrasom no meu pulmão. A resposta era sempre: daqui a pouco eles vem. 
Finalmente, às três horas da manhã, apareceu uma médica com o aparelho. 
Estava cochilando. Com a movimentação acordei. 
Ela perguntou se queria fazer o exame naquele momento. Respondi que sim. Que a aguardava ansioso há muito tempo.
Ela, então realizou os exames. 
Ao final perguntei:
- E então? Está tudo bem?
- Sim, tem um pouco de água no pulmão, mas nada grave. Dá para o senhor sair.
- Que bom! Por favor, passe o relatório assim que a senhora puder, pois estou dependendo disso para sair da UTI.
- Pode deixar. Eu tenho alguns exames ainda hoje para fazer, mas logo cedo o relatório estará aqui para seu médico avaliar.
- Muito obrigado, doutora.
Após ela sair, pedi para um auxiliar de enfermagem chamar a enfermeira chefe, pois precisa falar com ela urgentemente.
Pensei: Eu tenho que tomar uma atitude. Preciso acabar com essa embromação.
A enfermeira nem bem chegou e fui falando com voz baixa, pois não tinha forças para falar com a voz alta e firme, como gostaria.:
- Deixa eu falar uma coisa para você...  
- Primeiro boa noite, senhor José. – disse ela, interrompendo minha fala , com educação. - O senhor quer falar comigo?
- Quero sim. Ah! Boa noite para você também.
- Pode falar. O que é que aconteceu?
– Não aconteceu nada. Ou melhor, aconteceu, sim. É o seguinte. Eu estou aqui na UTI há muitos dias... Você sabe disso.
- É verdade.
- Então, não vejo a hora de sair daqui.
- Todo mundo que esta aqui quer sair. – disse ela sorrindo.
- Eu sei. Eu sei. Mas, comigo é diferente. A doutora Kátia me prometeu na semana passada que eu sairia daqui ontem. Ela prometeu. E eu não sai... Entendeu?
Ela respondeu com um movimento de cabeça, concordando.
- Isso me deixou frustrado. Confesso. Eu não sei lidar com frustração. Eu me conheço bem... Ela disse que aguardava um exame que acabei de fazer. A médica fez o exame em mim agora há pouco. Ela disse que está tudo certo. Não tem mais desculpas. Quero sair daqui amanhã. Não importa a hora que for. Quero sair daqui amanhã. 
- Não é bem assim, senhor José.
- É sim. Eu me conheço. Já disse. Eu não sei lidar com frustração. Você me acompanha desde o inicio. Viu o que eu passei. Estou bem agora.
- O senhor está bem.
- Eu sei. Você sabe disso. Acontece que se eu não sair amanhã eu vou piorar... Eu me conheço.
- Não é assim, senhor José.
- É sim.
- Senhor José as coisas seguem um protocolo. Se o senhor puder, o senhor sai. Se não, o senhor vai ter que aguardar mais uns dias. O senhor precisa ficar totalmente bom para ir embora.
- Eu estou bem. Você é que não está entendo. Presta atenção. Eu estou afirmando para você que se eu não sair daqui amanhã, eu vou piorar. Eu preciso sair. Toda essa minha recuperação foi em função da meta que eu tinha de eu sair daqui ontem. A doutora Kátia me prometeu uma data. A data era ontem. Ela não cumpriu.
- Não foi culpa dela... O senhor viu o quanto demorou para vir o ultrasom.
- Olha, eu não quero saber de culpa. Não estou falando de culpa. Não quero buscar culpado. A questão é a seguinte. Ou eu saio daqui amanhã ou entro em depressão...Não depende de mim. Fala isso para ela. Eu me conheço. Você está falando com uma pessoa que sabe das coisas, que se conhece. Fala para a doutora Kátia que eu tenho que sair daqui amanhã, de qualquer jeito. Ela prometeu. Ela que cumpra. Eu fiz a lição de casa certinha, como ela mandou. Agora quero sair.
A enfermeira disse que falaria no dia seguinte com a Dra. Kátia.
Percebi que ela ficou impressionada com o meu argumento. 
No dia seguinte, às oito da manhã, eu estava acordado, aguardando a chegada da Dra. Kátia.
Vi quando ela entrou na sala da UTI. Ela nem me olhou, foi direto para seu lugar. Deu uma lida em alguns papéis. Em seguida disse para os enfermeiros que a rodeavam:
- Quero que o senhor José saia da UTI hoje. Liga para a menina da reserva de quartos. Peça para arrumar um quarto para o senhor José. Ele sai daqui hoje.
Pensei: Não acredito. Finalmente vou sair daqui. Acho que valeu aquela apertada que dei na enfermeira, durante a madrugada.
Enquanto a Dra. Kátia lia o relatório do exame de ultrasom e outros de sangue, que foram colhidos também na madrugada, começou a movimentação para a minha saída, que acabou só acontecendo no final da tarde.
 Um pouco antes de sair, chamei a Dra. Kátia, entreguei-lhe uma caixa de chocolate fechada. Dei-lhe um beijo na mão e disse:
- Muito obrigado. Desculpa qualquer coisa que tenha feito errado.
- Não tem nada errado, senhor José.
 - Agradeço muito à senhora. Minha vida foi salva graças a seu esforço e dedicação comigo, aqui na UTI. Muito obrigado, mesmo.
- Não tem nada que agradecer. É nossa obrigação. Se tiver que agradecer, agradeça o trabalho de toda a nossa equipe.
- A equipe que a senhora lidera. A senhora é a chefe daqui. Fico muito grato a todos, mesmo. Agradeço a todos, através da senhora. Muitíssimo obrigado. Vocês foram maravilhosos, muito pacientes comigo.
- Agradeça seu médico, doutor Paulo. Ele lutou muito por você, viu. De vez em quando a gente tinha até umas briguinhas aqui, por sua causa. Ele defendeu muito você aqui.
- Eu sei disso. Não tenho nem palavras para agradecer o doutor Paulo. É um amigão. Nunca mais vou esquece-lo.
Ao chegar ao quarto estava radiante. A minha saída da UTI foi uma vitória.
Dormi aquela noite, satisfeito. 

                                      continua no próximo capitulo
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