Capitulo XXVI – A segunda saída
da UTI
Novo dia.
Acordei um pouco atordoado.
Quando me dei conta, estava
andando em uma ampla área, que ficava em um plano mais alto que a rua.
Tinha retornado à cidade
universitária da USP.
Nesse local havia um pavilhão
japonês, próximo a um grande lago, margeado por vegetação característica do
Japão. Havia uma ponte em forma de arco com portais vermelhos.
Pensei: Puxa vida! Nunca tinha
visto esse pavilhão aqui na cidade universitária. Deve ser novo. Deve ter sido
construído graças a uma doação do governo japonês.
Continuei caminhando e vi que
havia um pequeno hospital, na parte de baixo.
Pensei: Vou entrar nesse
hospital. Deve ser bom. É japonês. Estou precisando me recuperar. Vai ser aqui
que vou ficar.
Entrei.
Perguntei para a recepcionista se
poderia ficar no hospital.
Ela disse que sim, pois o
atendimento era gratuito.
Vi em uma parede o nome Medial,
que é o meu plano de saúde.
Perguntei se havia convenio com
a Medial.
Ela confirmou que sim e disse
que era a Medial quem gerenciava o hospital.
Resolvi usar o convenio, pois
não achei justo receber o atendimento gratuito, tendo um convenio medico.
Apresentei minha carteirinha e ela
preencheu minha internação.
Fui conduzido para a UTI.
No caminho, um pouco antes da
entrada da UTI, cheguei a um local que parecia um desfiladeiro. De um lado havia
a parede e de outro um amplo vale profundo. Junto à parede, em um nível bem alto,
havia uma ponte estreita, com pisos em madeira, com corrimão em cordas grossas.
Caminhei devagar pela ponte. No
meio do percurso parei para observar o que acontecia lá embaixo.
Havia uma cerimônia onde estavam
reunidos alguns monges budistas.
Eles tinham o cabelo cortado bem
rente á cabeça. Trajavam roupa típica. Estavam enrolados em mantas de seda, da
cor alaranjada e usavam sandálias de couro.
Havia, junto a eles, algumas
pessoas de origem oriental, alguns homens vestidos com terno e gravata e
mulheres com vestidos a rigor, com chapéu.
Estavam todos posicionados de
frente a uma parede bem alta, que tinha no centro uma enorme cachoeira de
pedra, de onde caia um grande volume de água iluminada por uma cor azulada.
Essa água era armazenada em um tanque de pedras, iluminado por uma luz branca.
O ambiente era meio lusco fusco,
com iluminação indireta, possibilitando ver, refletida nas paredes, luzes
coloridas dos aparelhos que monitoravam os pacientes, que estavam na parte
superior.
Eles recitavam mantras em uma
oração budista, que não entendi.
O ambiente estava gelado. Senti
um pouco de frio e me encolhi abraçando-me.
Pensei: Parece o Himalaia.
Fiquei receoso de presenciar a
cerimônia, sem que estivesse autorizado.
Como ninguém reclamou continuei
observando, quieto e curioso, por um bom tempo.
Quando terminou, finalmente, fui
conduzido para o meu lugar na UTI.
Pensei: Aqui vou ser bem
tratado. A cultura oriental preza pelo bom atendimento.
Ao chegar à minha cama, chamei
uma enfermeira que passava próximo à minha cama. Como não podia falar, acenei
com as mãos. Ela percebeu e veio até mim.
- Água – pedi para ela, movendo
os lábios, mas sem voz.
- O que é que o senhor disse?
Resolvi fazer mímica. Fiz um
movimento com a mão direita, imitando estar segurando um copo e depois virando-o
na boca.
- O senhor quer água?
Respondi afirmativamente com a
cabeça.
- Não, senhor José, o senhor não
pode beber água. – disse a enfermeira.
- Sede – tentei falar, olhando
para ela, para que pudesse ler meus lábios.
- Olha, vou pegar um copo de
água para o senhor bochechar. Está bem?
Concordei com o dedão em riste.
Ela me trouxe dois copos. Um com
a água e outro vazio.
- O senhor bebe um pouco,
bochecha e depois devolve no copo vazio. Não pode engolir. Entendeu?
Confirmei com a cabeça.
- O senhor não pode engolir. Senão
o senhor engasga. – insistiu a enfermeira.
Agi como ela me recomendara.
Acabou a água do copo. Fiquei um
pouco aliviado da sede.
Pouco tempo depois, senti
novamente a boca seca. Passei minha língua no céu da boca e senti a textura da
mucosa parecendo que estava trincada e grossa. A minha língua também parecia
que estava trincada.
Pensei: Tanto tempo sem beber
água, está tudo ressecado.
Continuava com sede. Tentei
puxar saliva para a boca e engolir, mas havia pouca saliva. Minha boca estava
muito ressecada.
Pensei: Sempre salivei bastante.
Quando ia ao dentista ele até reclamava que eu salivava muito. Agora está seco.
Preciso beber água.
Passou outra enfermeira e
novamente fiz os acenos com as mãos para chamá-la. E esta também fez a mesma
coisa, trouxe a água em dois copos e fez as mesmas recomendações.
Passou um tempo e novamente
voltei a sentir sede.
Pensei: É isso ai. Descobri o
caminho das pedras. Vou chamar a enfermeira e com isso re-hidrato minha boca.
Mas, dessa vez enfermeira que me
atendeu disse:
- Não, senhor José. O senhor está abusando. O
senhor não pode beber água.
- Sede – falei sem voz, olhando
para ela afim de que ela pudesse ler meus lábios.
Ela entendeu e disse:
- Senhor José, o senhor já
bocejou bastante. Agora chega.
- Sede.
- Não. Já foi o suficiente. Mais
tarde. Agora, não. Não pode.
Fiquei aborrecido.
Pensei: Por que não posso beber
água? Essa enfermeira é chata. Estou com sede. Ela fala isso porque não é ela
quem está com sede. Chata!
Resolvi assistir televisão por
um tempo e dormi.
Quando acordei, estava a meu
lado um fisioterapeuta, muito forte, simpático, de nome Tiago, que me trouxe uma
caixinha contendo uma válvula de cor roxa. Ele a colocou na minha garganta. Mal
ele terminou de colocar a válvula, perguntou:
- Senhor José, vou fazer umas
perguntas para ver como o senhor está, OK?
Respondi com um sinal de
positivo com o dedo.
- O senhor me ouve bem?
- Sim. Normal. –respondi
finalmente falando.
- O senhor está enxergando bem?
- Sim. Estou. Vejo tudo bem. – disse
mexendo a cabeça para ambos os lados.
- O que o senhor está vendo? –
perguntou ele, mostrando sua mão.
- A sua mão.
- O senhor sabe onde está? –
perguntou Tiago.
- Sei.
- Onde?
Pensei: O que é que eu respondo agora? Sei que estou na cidade universitária da USP. Mas, sera que ele sabe disso? Minha mulher já me disse que estou no hospital em Moema. Acho melhor responder o que minha mulher disse. Sei la do porque ele esta fazendo todas essas perguntas. Vai que é para ver se estou bem de cabeça. Melhor eu dizer o que ele quer ouvir.
- estou no hospital Alvorada. Na UTI.
- O que o senhor está sentindo?
- Estou bem...Não sinto nada. Só estou cansado de ficar na
cama.
- Sente alguma dor?
- Não... Dor? Não. Quero ficar de pé.
- O senhor não pode ficar de pé. O senhor está muito fraco. O senhor não consegue ficar em pé. Se tentar o senhor
cai.
Pense: Essa coisa de ficar muito tempo deitado é ruim. Posso pegar uma pneumonia e ate morrer. Preciso ficar em pé, sentado. Não posso continuar deitado.
Perguntei:
- Você poderia me arrumar uma
poltrona? Eu vi uma por ai outro dia. Não aguento mais ficar deitado.
- Vou providenciar, sim. Boa idéia. O senhor ficaria sentado?
- Claro. É o que eu mais quero,
- Vou providenciar ainda hoje uma poltrona para
o senhor ficar um pouco sentado. Faz bem mudar de posição.
- Obrigado.
- Que bom! O senhor está bem
melhor. Agora é só recuperação e logo, logo, o senhor vai ter alta.
- É o que eu mais quero.
- Bom, tenho que ir. Tenho outros pacientes para visitar. Até mais tarde.
- Tchau.
À tarde, colocaram uma poltrona
ao lado da minha cama.
Tiago apareceu e me ajudou a
levantar, segurando-me junto a seu corpo.
Pedi para ele me soltar para eu
tentar ficar de pé.
Ele disse que eu não teria
forças.
Mas, eu insisti e ele atendeu, afrouxando o abraço.
Naqueles poucos segundos que me senti solto pude constatar que não tinha forças para me sustentar. Minhas pernas não aguentavam o meu peso.
Pensei: Como estou fraco. Não consigo ficar de
pé.
Ele explicou que teria que fazer
fisioterapia para voltar a andar, em razão de ter ficado muito tempo deitado, o
que atrofiou meus músculos. Mas, que eu me recuperaria rapidamente.
Tiago foi quem em todos os dias
seguintes, com exceção dos dias que estava de folga, até a minha saída da UTI,
que pela manhã, me colocava sentado na poltrona,
continua no próximo capitulo
continua no próximo capitulo
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