quarta-feira, 16 de julho de 2014

O problema da violência seria resolvido com um par de tênis da Nike?

Anos atrás, quando assistia a um programa jornalístico na televisão, vi um sujeito sendo entrevistado, que dizia ser líder comunitário de uma favela no Rio de Janeiro.
Ele afirmou que o problema da violência seria resolvido com um par de tênis da Nike.
Soou-me estranha essa proposta. Fiquei mais atento para entender o que ele queria dizer com essa ideia.
Ele argumentava que os adolescentes das favelas e da periferia não são diferentes dos demais adolescentes que vivem nos bairros mais nobres. Eles desejam os mesmos itens de consumo.
Ele explicava que os adolescentes, de uma forma geral, são alvos constantes das propagandas nas mídias, que os impinge ao consumo. Com a diferença de que os adolescentes das favelas não têm condições de consumir.
Assim, esses adolescentes, na busca de recursos para atender suas demandas de consumo, saem às ruas da cidade para cometer pequenos delitos, que tanto incomodam a todos, e que algumas vezes pode ate culminar com uma morte de um inocente cidadão.
Concluiu dizendo que se esses adolescentes pudessem usufruir do mínimo da vida oferecida pelas mídias, de forma honesta, em sua grande maioria, não optariam pelo mundo do crime.
Pensei, num primeiro momento, que se tratava de uma idéia absurda. Que esse sujeito falava bobagens.
Refletindo melhor, revi minha posição.
Primeiro pelo fato de que ele, por viver junto à comunidade, conhecia muito mais de perto a realidade daquelas pessoas.
E, por conseguinte, sabe de suas aspirações e desejos.
Depois, porque me ocorreu um pensamento que aprendi no passado distante, que concordo: Quem tem o que perder não quer perder o que tem.
O raciocínio é simples.
Quando uma pessoa tem um bom emprego, um bom salário, uma condição de vida digna, não vai se aventurar no crime e perder sua confortável posição.
Claro, há exceções.
Mas, a grande maioria das pessoas segue esse raciocínio.
Essa maneira de pensar foi a mola propulsora da cultura americana. Que tem uma grande classe média. A grande maioria da população tem um nível digno mínimo.
Entretanto, essa filosofia tem um condicionante. Só funciona quando a pessoa tem certeza de que, cometendo um crime, há um risco iminente de perda de sua posição, através de uma punição rigorosa.    
Quando uma pessoa tem a certeza da impunidade, ou que a punição pode ser atenuada, de alguma maneira, esse raciocínio se esvai.
Na medida em que alguém comete um crime e nada lhe acontece, certamente, vai tentar cometer crimes.
O ser humano acredita que a condição mais fácil de auferir vantagens, seja de qualquer espécie, é através do crime.
Isto porque, no crime, a pessoa tem a falsa sensação de levar vantagem perante os demais. Na medida em que os demais cumprem a lei e ele não, realmente, há uma imediata vantagem individual.
E essa percepção ocorre independente do grau da educação, da formação cultural, do status social e econômico, da crença religiosa, e, ate mesmo, do nível de inteligência.
Pelo menos é o que se constata em qualquer lugar do planeta.
Aqui no Brasil, há alguns anos, ingressamos na era da impunidade, que foi a resultante de diversos posicionamentos equivocados.
Mas, como se chegou a isso?
Havia uma aversão ao rigor das ações exacerbadas durante o governo militar, que algumas vezes ultrapassavam os limites da lei.
Assim, por parte de alguns, bem intencionadas, mexeram na lei.
Para impedir a prisão de pessoas que não fossem pegas em flagrante delito, estabeleceu-se um prazo diminuto para prisão em flagrante.
Além disso, houve uma redução dos casos que tipificam a prisão preventiva, junto com um aumento das exigências a serem cumpridas para que as prisões ocorressem.
Com isso, muitos deixaram de ser presos.
Quando acontecia a prisão pela policia, muitos alcançavam a liberdade recorrendo à justiça, que privilegiando a presunção da inocência, os soltaram.
Havia uma superlotação carcerária. Os governos não construíram presídios o suficiente para atendimento dessa população.
Para resolver o problema, por parte de alguns, bem intencionadas, adotou-se a solução de reduzir a população carcerária. Assim, mexeram na lei.
Foram instituídas as progressões das penas, que visavam reduzir o tempo de permanência dos condenados nas prisões.
Com isso, muitos deixaram as prisões.
Havia um pensamento humanista, por parte de alguns, bem intencionadas, de que se o preso fosse socializado dentro das prisões, ele sairia melhor e integrado à sociedade.
Foram criadas as visitas intimas, na qual os presidiários podiam ter um relacionamento sexual dentro das cadeias.
Concomitantemente foram instituídas diversas saídas em datas comemorativas, bastando para isso que os apenados cumprissem alguns requisitos de fácil atendimento. 
Acreditava-se que o relacionamento com familiares o induziriam a ter uma convivência social mais integrada. Esqueceram, entretanto, que isso já existia lá fora e de nada adiantou para evitar que cometessem crimes e fossem presos.
Havia uma preocupação por parte de alguns, bem intencionadas, em melhorar as condições de vida dos menores.
Criou-se o estatuto da criança e dos adolescentes.
Para quem já leu, trata-se de uma peça muito boa.
Desde que aplicada na integra.
Mas, nada se fez para criar as condições de infra estrutura físicas adequadas, assim como de equipe técnica experiente, necessárias para que os adolescentes carentes pudessem mudar suas expectativas de vida.
Ao contrário, continuaram abandonados pela família, que já estavam desestruturadas, como ocorria antes. O estado, também nada fez com eficiência, deixando-os à própria sorte.
O cenário descrito não ficou despercebido pelos não bem intencionados.
O mundo do crime comemorou eufórico o alivio nas punições.
Seus agentes incrementaram suas ações, adicionando mais um componente implacável nas estruturas judiciárias e na própria policia, que já vivenciava essa experiência. A corrupção!
 As leis mais brandas, com a corrupção assolando, a impunidade atingiu seu clímax.
Assim, concluo que realmente a ideia daquele líder comunitário é boa, mas não aplicável em nosso Brasil.
Ou repensamos tudo novamente e acabamos de vez com a corrupção e com a impunidade, ou nada há para se fazer, além de continuarmos lamentando o estado de coisa que chegamos. 

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