Anos
atrás, quando assistia a um programa jornalístico na televisão, vi um sujeito
sendo entrevistado, que dizia ser líder comunitário de uma favela no Rio de
Janeiro.
Ele
afirmou que o problema da violência seria resolvido com um par de tênis da
Nike.
Soou-me
estranha essa proposta. Fiquei mais atento para entender o que ele queria dizer
com essa ideia.
Ele
argumentava que os adolescentes das favelas e da periferia não são diferentes
dos demais adolescentes que vivem nos bairros mais nobres. Eles desejam os
mesmos itens de consumo.
Ele
explicava que os adolescentes, de uma forma geral, são alvos constantes das
propagandas nas mídias, que os impinge ao consumo. Com a diferença de que os
adolescentes das favelas não têm condições de consumir.
Assim,
esses adolescentes, na busca de recursos para atender suas demandas de consumo,
saem às ruas da cidade para cometer pequenos delitos, que tanto incomodam a
todos, e que algumas vezes pode ate culminar com uma morte de um inocente
cidadão.
Concluiu
dizendo que se esses adolescentes pudessem usufruir do mínimo da vida oferecida
pelas mídias, de forma honesta, em sua grande maioria, não optariam pelo mundo
do crime.
Pensei,
num primeiro momento, que se tratava de uma idéia absurda. Que esse sujeito
falava bobagens.
Refletindo
melhor, revi minha posição.
Primeiro
pelo fato de que ele, por viver junto à comunidade, conhecia muito mais de
perto a realidade daquelas pessoas.
E,
por conseguinte, sabe de suas aspirações e desejos.
Depois,
porque me ocorreu um pensamento que aprendi no passado distante, que concordo:
Quem tem o que perder não quer perder o que tem.
O
raciocínio é simples.
Quando
uma pessoa tem um bom emprego, um bom salário, uma condição de vida digna, não
vai se aventurar no crime e perder sua confortável posição.
Claro,
há exceções.
Mas,
a grande maioria das pessoas segue esse raciocínio.
Essa
maneira de pensar foi a mola propulsora da cultura americana. Que tem uma
grande classe média. A grande maioria da população tem um nível digno mínimo.
Entretanto,
essa filosofia tem um condicionante. Só funciona quando a pessoa tem certeza de
que, cometendo um crime, há um risco iminente de perda de sua posição, através
de uma punição rigorosa.
Quando
uma pessoa tem a certeza da impunidade, ou que a punição pode ser atenuada, de
alguma maneira, esse raciocínio se esvai.
Na
medida em que alguém comete um crime e nada lhe acontece, certamente, vai
tentar cometer crimes.
O
ser humano acredita que a condição mais fácil de auferir vantagens, seja de
qualquer espécie, é através do crime.
Isto
porque, no crime, a pessoa tem a falsa sensação de levar vantagem perante os
demais. Na medida em que os demais cumprem a lei e ele não, realmente, há uma
imediata vantagem individual.
E
essa percepção ocorre independente do grau da educação, da formação cultural, do
status social e econômico, da crença religiosa, e, ate mesmo, do nível de
inteligência.
Pelo
menos é o que se constata em qualquer lugar do planeta.
Aqui
no Brasil, há alguns anos, ingressamos na era da impunidade, que foi a
resultante de diversos posicionamentos equivocados.
Mas,
como se chegou a isso?
Havia
uma aversão ao rigor das ações exacerbadas durante o governo militar, que
algumas vezes ultrapassavam os limites da lei.
Assim,
por parte de alguns, bem intencionadas, mexeram na lei.
Para
impedir a prisão de pessoas que não fossem pegas em flagrante delito,
estabeleceu-se um prazo diminuto para prisão em flagrante.
Além
disso, houve uma redução dos casos que tipificam a prisão preventiva, junto com
um aumento das exigências a serem cumpridas para que as prisões ocorressem.
Com
isso, muitos deixaram de ser presos.
Quando
acontecia a prisão pela policia, muitos alcançavam a liberdade recorrendo à
justiça, que privilegiando a presunção da inocência, os soltaram.
Havia
uma superlotação carcerária. Os governos não construíram presídios o suficiente
para atendimento dessa população.
Para
resolver o problema, por parte de alguns, bem intencionadas, adotou-se a
solução de reduzir a população carcerária. Assim, mexeram na lei.
Foram
instituídas as progressões das penas, que visavam reduzir o tempo de
permanência dos condenados nas prisões.
Com
isso, muitos deixaram as prisões.
Havia
um pensamento humanista, por parte de alguns, bem intencionadas, de que se o
preso fosse socializado dentro das prisões, ele sairia melhor e integrado à
sociedade.
Foram
criadas as visitas intimas, na qual os presidiários podiam ter um
relacionamento sexual dentro das cadeias.
Concomitantemente
foram instituídas diversas saídas em datas comemorativas, bastando para isso
que os apenados cumprissem alguns requisitos de fácil atendimento.
Acreditava-se
que o relacionamento com familiares o induziriam a ter uma convivência social
mais integrada. Esqueceram, entretanto, que isso já existia lá fora e de nada
adiantou para evitar que cometessem crimes e fossem presos.
Havia
uma preocupação por parte de alguns, bem intencionadas, em melhorar as
condições de vida dos menores.
Criou-se
o estatuto da criança e dos adolescentes.
Para
quem já leu, trata-se de uma peça muito boa.
Desde
que aplicada na integra.
Mas,
nada se fez para criar as condições de infra estrutura físicas adequadas, assim
como de equipe técnica experiente, necessárias para que os adolescentes carentes
pudessem mudar suas expectativas de vida.
Ao
contrário, continuaram abandonados pela família, que já estavam
desestruturadas, como ocorria antes. O estado, também nada fez com eficiência,
deixando-os à própria sorte.
O
cenário descrito não ficou despercebido pelos não bem intencionados.
O
mundo do crime comemorou eufórico o alivio nas punições.
Seus
agentes incrementaram suas ações, adicionando mais um componente implacável nas
estruturas judiciárias e na própria policia, que já vivenciava essa experiência.
A corrupção!
As leis mais brandas, com a corrupção
assolando, a impunidade atingiu seu clímax.
Assim,
concluo que realmente a ideia daquele líder comunitário é boa, mas não
aplicável em nosso
Brasil.
Ou
repensamos tudo novamente e acabamos de vez com a corrupção e com a impunidade,
ou nada há para se fazer, além de continuarmos lamentando o estado de coisa que
chegamos.
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