Continuando minha saga para
tentar resolver uma hérnia abdominal incisional, conseqüência de cirurgia de hepatectomia, realizada há cinco anos atras, descobri,
pela internet, que ha uma técnica de reconstrução do músculo obliquo externo,
no Hospital das Clinicas.
Cumpri todo o ritual exigido para
marcar consulta nesse hospital.
Tive que me inscrever no SUS, ir
a um posto de saúde, passar por uma consulta com o medico local, que, após seu
exame, me encaminhou para o HC e aguardar o agendamento feito pelo posto de saude.
Depois de dois meses, finalmente,
chegou o agendamento da consulta. No texto havia a informação de que a consulta
seria a 7 horas da manhã, mas que deveria chegar às 6 horas, para cumprir as
formalidades de abertura de prontuário.
No dia da consulta, cheguei a 15
para a 6 horas, passei de carro em frente a entrada e vi uma fila quilométrica!
Pensei: tudo bem, dou um tempo
para a manada entrar. Entro depois, com mais calma.
Estacionei o carro no subsolo e
quando cheguei a portaria a fila tinha se dissipado, pois já tinham aberto as
portas.
Fui ate a recepção, onde deveria
me apresentar. Deparei-me com um fila enorme. Pra pegar senha, claro!
Enquanto isso conversei com os
demais pacientes. Nesse ponto, sou muito comunicativo. Ouvi historias de suas
doenças e casos. Contaram que vieram de ambulância do interior. Um deles disse
que a viagem durou 12 horas. Como sou provocador, perguntei sobre a copa. Todos,
ali reclamaram que o governo, ao invés de investir em saúde, construía
estádios. Bom de ouvir isso do povo. Aproveitei e falei:cuidado para não errar
o voto. E tive que ouvir. São todos sem vergonha!
Entre ficar na fila, pegar a
senha, aguardar e ser atendido por uma das duas funcionarias, apesar de haver
20 guichês de atendimento, levou 1 hora.
Pensei: tudo bem, a consulta é as
sete, esta dentro do previsto.
Alias, nem entendi do porque ter estado
ali. Eles já tinham todos os meus dados no computador.
Recebi um novo papel de
encaminhamento e fui para a sala onde seria o atendimento da consulta, que
ficava em outro andar.
Caminhei ate o elevador. Nova Fila!
Resolvi subir as escadas, a pe
mesmo.
Pensei: vou mais rápido e passo
na frente dessa gente.
Ledo engano.
Chegando ao andar, vi os
corredores apinhados de gente. Parecia um formigueiro.
Nunca vi tanta gente feia,
reunida. E com aquele cheiro característico de dentes não escovados, suor forte
e azedo.
Seguindo pelo corredor ate a sala
onde deveria ir, fui-me deparando com médicos, circulando pra la e pra ca,
enfermeiros conduzindo pacientes em macas, em cadeiras de rodas. E fila para
todo lado.
Vi gente com todo tipo de
problema e gravidade. Estavam em pe ou sentados. Observei que todos tinham uma
cara de sofrimento, talvez, para dar mais clima de desgraça, talvez porque
realmente sentiam uma dor terrível. Alguns, não dor física, mas dor
psicológica, pois, depois de atendidos, saiam, vamos dizer assim, recuperados.
Alguns, que mancavam, saiam andando normalmente.
Pensei: la dentro, deve ser a
sala dos milagres!
O prédio tem uma abertura central
larga, por onde deve ocorrer a ventilação, pois não há nenhuma janela para o
exterior. Nesse vão, ha uma rampa de acesso aos andares, os halls dos
elevadores e escada. E de cada lado, no sentido longitudinal, ha um corredor de
acesso as salas de atendimento.
Os sons se misturavam. Gente
falando, alto falante, que chamava pessoas no outro corredor. Um pouco zonzo,
com falta de ar limpo, cheguei a sala determinada.
Pensei: estou no cantado inferno
de Dante!
Deparei-me com outra fila
monstruosa. Para pegar senha...de novo!
As 8 horas recebi a senha.
Li o aviso afixado na parede: As
senhas não são chamadas pelo numero seqüencial.
Não entendi. Como assim?
Ai fiquei sabendo que nesse local
eram recepcionados diversos tipos de cirurgia. O sistema não classificava a
senha entre as diversas modalidades de cirurgia. E dentro das modalidades de
cirurgia, não classificava, também, pelos diversos tipos de atendimentos, como a
triagem inicial, meu caso, o retorno com exames, o retorno para agendamento da
cirurgia propriamente dito. Enfim, tudo junto e misturado. Com isso, você nunca
sabe quando será sua vez!
A sala de espera lotada, sem
ventilação, porque ar condicionado nem pensar. As cadeiras, todas ocupadas.
Tive que ficar em pe, flutuando no ar viciado e mal cheiroso.
Pensei: o que é que eu estou
fazendo aqui? Devo estar doido.
Como alguém se levantou para ser
atendido, aproveitei e sentei. Estava perto da ala de entrada da cirurgia
cardíaca.
A porta dessa ala se abriu. Apareceu
um enfermeiro. Rapidamente se aglomerou um grupo de pessoas, apresentando seus
papeis e senha.
Esse enfermeiro selecionava as
pessoas e pedia que aguardassem, ao lado, para entrar.
Foi ai que apareceu um sujeito,
com cara de Mane, sem senha, sem nada. O enfermeiro informou que precisaria da
senha e do tal papel. Ele argumentou que era retorno, que tinha uns exames pra
fazer e que era amigo de uma enfermeira de tal andar. Rapidamente, o enfermeiro
disse para o paciente que ele retornasse la com ela e pedisse que a mesma
ligasse para ele, pois assim ele daria um jeito de encaixá-lo.
O que? Fura fila?
Comecei a entender do porque da
senha ser uma bagunça. Ninguém pode reclamar que passaram na frente!
Deu nove horas, e nada!
Levantei-me e fui reclamar.
Imediatamente, perdi meu lugar no assento.
A recepcionista, com cara de
brava disse:
- Reclame com a enfermeira.
Fui la, na porta da ala das
cirurgias abdominais. A porta estava aberta. Aguardei chegar uma delas. Como
não aparecia ninguém, resolvi entrar. Aparece uma delas, que já me repreendeu:
- O senhor tem que aguardar la
fora ser chamado.
Respondi:
- Sim, estou aguardando desde as
seis. Minha consulta era as sete. Já são mais de nove horas e ate agora não fui
chamado.
- O senhor não esta vendo que
todo mundo esta ai aguardando. Aqui é demorado mesmo. Se o senhor estiver com
pressa, reagende para outro dia e va embora. – respondeu ela.
- Minha senhora, eu não vou ir
embora agora, depois de tanto tempo esperando. So quero saber a que horas serei
atendido – disse, mostrando meu papel de encaminhamento.
Ela olhou o papel e devolveu-me
rapidamente, dizendo:
- Seu atendimento é triagem. O
medico que vai lhe atender, já atendeu alguns pacientes e foi chamado para uma
reunião.
- Como assim? Reunião no meio do
expediente?
- Sim, meu senhor, as regras aqui
são essas. Va la, sente-se e aguarde. Ou se quiser va embora e retorne outro
dia.
- Mas, não tem nem lugar pra
sentar.
- Senhor, aqui é assim.
Voltei e aguardei mais uma hora.
A paciência, novamente, me
atormentou.
Pensei: vou procurar o chefe.
Quero falar com o chefe.
Voltei a porta da ala e
perguntei:
- Quem é o chefe daqui?
A enfermeira rabujenta disse:
- É a Ivani, a enfermeira chefe.
- OK, quero falar com ela.
- Agora ela não pode atender,
pois esta fazendo uns procedimentos na ala de cirurgia toraxica. Aguarde.
Passaram-me mais trinta minutos.
Aparece a tal da Ivani. Falei com
ela:
- Senhora, estou aqui desde a
seis da manhã, já são dez e meia e continuo aguardando para ser atendido. Fui
informado que o medico esta em
reunião.
Um pouco mais gentil, ela
explicou que o medico era residente e fazia parte do seu treinamento passar por
diversas atividades medicas. E tão logo terminasse o que estava fazendo,
retornaria para o atendimento.
Finalmente ás quinze para meio
dia o medico me atende.
Ele queria saber que tipo de
cirurgia iria fazer.
Já fui mostrando minha barriga e
disse que precisava realizar uma cirurgia para correção da hérnia.
Ele nem me examinou e disse:
- Não é aqui. O senhor tem ir
para outra ala. A ala de cirurgia de parede abdominal. Estou reencaminhando o
senhor. O senhor vai na sala oito e agende uma consulta.
- Mas...mas..me encaminharam para
ca...
- Senhor, já disse que não é
aqui.
- OK, desculpe.
Sai e fui para a outra ala. Nova
fila.
Pensei: não vou ficar nessa fila.
Fui ate o balcão, mostrei meu
encaminhamento e perguntei:
- Senhora, tenho que ficar nessa
fila para ser atendido?
Ela olhou o papel e respondeu:
- Sim, é aqui. Tem que ficar na
fila. Mas, deixa ver....ah! o senhor pode ir embora. Não estamos agendando nada
para esta semana. Volte semana que vem.
Fui embora. Fazer o que?
Chego no estacionamento.
Custo? R$33,00!!!
Isso porque é um estacionamento
para um hospital supostamente para pessoas carentes!
Inconformado, perguntei para
atendente:
- Posso pagar em seis vezes, sem
juros, no cartão de cerdito?
Ela riu.
Eu ri.
Foi bom. Deu pra descontrair.
Mas, no fundo fiquei aborrecido.
Perdi meio dia para voltar para
onde estava no inicio do dia.
Retorno para o passado!
Na semana seguinte retornei a sala oito, para fazer o agendamento.
Novamente a atendente disse que não havia vagas para agendamento.
Apos muita insistencia, tendo que apelar para uma dramatização sobre os problemas que aquela hernia causa para mim, ela, finalmente, agendou para seis meses adiante.
Esse é o SUS que todos reclamam!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário é bem vindo!
Agradeço sua participação.