domingo, 22 de junho de 2014

Uma experiencia bio desagradavel - capitulo IX

Capitulo IX – A justiça sucumbe a corrupção

No dia seguinte, apareceu junto com a procuradora um grupo de quatro procuradores, vestidos de terno e gravata, junto com uma auxiliar vestida de enfermeira.
Chegaram movimentando tudo. Pegaram as fichas de todos os pacientes para examinar a situação de cada um. A procuradora sentou-se, leu a minha ficha e disse olhando para mim:
- Você está melhor! Estou lendo aqui. Fique tranqüilo que você será removido.
O Flávio, naquele dia, estava comandando a UTI, apesar de não ser noite.
Estava postado no balcão de apoio dos enfermeiros. Com as duas mãos apoiadas no balcão dava ordens para todo mundo. Parecia um dono de bar. Muito agitado.
A procuradora tentou falar com ele, mas ele dizia que não podia conversar, pois tinha que comandar a UTI e disse:
- Eu trabalho com vidas, doutora. Não posso perder um minuto. É a vida dos meus pacientes.
Pensei: Que farsante! Ela só esta fazendo tipo. Nem médico ele é.
Os procuradores vasculhavam tudo. Reuniram uma série de documentos, que diziam que seriam apreendidos para levarem.
Pensei: Finalmente agora eles vão descobrir tudo.
O Flávio reagiu:
- Não pode! Não, não, não. Isso é prontuário que trata da vida de cada paciente aqui. Se tirar daqui a coisa vai ficar feia. Vai desorientar toda a enfermagem. Não pode levar, não! Tem prescrição médica. Não pode levar. Depois ninguém se responsabiliza e sobra para mim. Não vai levar, não.
Um dos procuradores falou para o Flávio:
- Quero falar com o diretor responsável pelo Hospital.
- O senhor vai ter que ir lá ao oitavo andar.
- Mas, o senhor não é diretor?
- Doutor, é no oitavo andar – falou Flávio com um ar de desdenho.
Os procuradores se reuniram e designaram um deles, que foi para subir e falar com o diretor.  Era um procurador mais velho.
Pensei: Esse tem mais experiência e agora ele vai dar uma dura nessa turma.
Depois de algum tempo ele desceu, chamou os outros e disse que todos deveriam subir para conversar com o diretor, que tinha uma proposta interessante.
Pensei: Não é possível. Eles vão comprar essa turma.
 A procuradora disse que não iria subir, pois precisava organizar algumas coisas. Os demais subiram e ela e a enfermeira ficaram. 
A enfermeira assistente da procuradora ficava reclamando com o Flávio das condições de trabalho e salário dos enfermeiros. Dizia que os enfermeiros ganhavam pouco. Ele não falava nada, ia de um lado para outro, apressado e esbaforindo, se esquivando dela.
A procuradora saiu dizendo que ia tomar um café e voltava logo.
O ambiente aos pouco foi escurecendo. As luzes estavam com baixa intensidade.
Pensei: Será que ele vai fazer a boate de novo?
Havia muitos enfermeiros trabalhando. O ambiente estava agitado.
De repente, apareceu um rapaz alto, magro, olhos azuis, tipo alemão, vestindo, impecavelmente, um terno escuro. Com um celular na mão, mostrava para todos, que na tela do celular dele havia um emblema da procuradoria federal. Dizia que era um procurador com especialidade em enfermaria.
Pegou um avental branco no armário e vestiu sobre o terno.
Pensei: Que cara jovem para ser procurador! Deve ser estudioso. Pelo menos, tem cara.
Ele ficava andando de um lado para o outro. Na mão direita vi que ela segurava uma seringa com a agulha voltada para cima.
Ele agitava ainda mais o ambiente. Queria ver tudo. Reclamava de tudo. Mandava limpar o chão, trocar os pacientes que dizia que estavam com a fralda suja. Olhava os prontuários e determinava que seguissem rigorosamente a dosagem dos medicamentos. Olhava os refis de plástico pendurados em uma peça metálica apropriada para isso, que ficava ao lado dos pacientes. Conferia  se o que constava no refil era o que estava prescrito. Reclamava muito. Ninguém falava nada. Todos obedeciam.
Pensei: Esse vai botar ordem na casa! Que experiência! E tão jovem.
Olhava baia por baia, cada paciente. Conversava com todos eles.
Chegou a hora de uma enfermeira dar-me um banho. Tirou-me o lençol, a fralda e o avental curto, tipo bata, amarrado pelas costas, que usava.  
O banho da UTI é uma lavagem qual eles jogam água com sabão sobre todas as partes do corpo. Às vezes molhavam o cabelo. Depois passam um pano molhado e finalmente enxugam. Era uma lavagem refrescante, mas nada como um banho de ducha.
Algumas vezes, um enfermeiro fazia a minha barba com um aparelho de barbear descartável.  Nesse dia fizeram minha barba.
Como essa operação molhava a cama, mas não o colchão que era revestido com plástico, os dois enfermeiros faziam uma troca malabaristica de lençóis. Iniciava com um enfermeiro rolando o paciente para o outro lado oposto da cama. Nesse lado, o outro enfermeiro ficava segurando o paciente, colado a seu corpo. Enquanto isso, o primeiro enfermeiro retirava o lençol molhado e substituía por um novo lençol limpo. Quando este lençol estava colocado até a metade longitudinal da cama,  o outro enfermeiro rolava o paciente para o lado já substituído. Assim, terminavam de arrumar a cama.  
Para concluir, colocavam uma fralda limpa e uma nova bata. Estávamos limpos e higienizados.
 Algumas vezes eles me calçavam uma meia. Minha mulher, todos os dias, deixava um par de meias novas sobre o criado mudo e levava embora a meia usada.
Quando eles não colocavam a meia, minha mulher ao me visitar as colocava nos meus pés, para que eu não sentisse frio. Ela ficava aborrecida e reclamava da displicência dos enfermeiros para comigo. Mas, para mim era excesso de zelo dela.
Foi no momento de um banho que estava sendo submetido, que o procurador enfermeiro entrou na minha baia.
- Meu nome é Roberto. Muito prazer. Estou aqui para arrumar essa bagunça toda que o senhor está vendo. – disse ele sério.
- Oi.
- E o senhor..., senhor José, não é?. Tudo bem com o senhor? – perguntou-me.
- Sim, estou bem.
- E essa água não está fria para o senhor?
Pensei: Não vou reclamar na frente da enfermeira que a água está um pouco fria. Dá para agüentar.
- Está boa. – respondi.
Ele saiu da minha baia sem dizer nada.
Voltou, em seguida, portando um balde com água quente.
Misturou um pouco no balde que a enfermeira utilizava para me lavar. Pegou desse balde e jogou um pouco de agua sobre mim.
Perguntou:
- E agora?
- Está boa.
Ele misturou mais água quente. E jogava em cima de mim, até que jogou um pouco do balde quente na minha parte intima.
Eu reagi:
- Não! Para. Assim não. Está muito quente. ...Queima.
- Você estava lavando o senhor José com água fria. – disse Roberto sério para a enfermeira. - Não pode. Ele não reclamou, mas não pode dar banho com água fria.
A enfermeira ficou calada.
- O senhor viu que tem diferença, não é senhor José. Água fria é água fria. Água quente é água quente. O senhor observou quanto de água quente eu tive que adicionar até o senhor reclamar. Tem que ser água morna. Não é senhor José? – disse o Roberto com um belo sorriso para mim.
- Sim. Estava fria antes. – concordei.
- O senhor precisa reclamar. Não deixe ninguém tratar mal do senhor. Eles recebem para tratar o senhor bem.
Pensei: Que sujeito! Faltava esse sujeito aqui.
Flávio estava entre os enfermeiros, conversando com um e outro.
Roberto olhou para e ele e disse-me que achava estranho o Flávio agir como se não fosse médico. Estranhava a conduta dele.
Pensei: Ele precisa saber a verdade. O Flávio não se chama Flávio e é advogado. Vou contar para ele. Afinal ele precisa saber da verdade para tomar providencias.
Chamei Roberto para mais perto de mim e falei com a voz quase murmurando que o nome do Flavio não era Flávio, mas sim Paulo. Disse também que ele não era médico e sim advogado.
Roberto fez uma cara de espanto e perguntou como eu sabia disso tudo. Falei que conhecia o Paulo de muito tempo. Que na juventude era conhecido como Paulo armadura.
Ele ouviu, não falou nada e saiu da minha baia.
Pensei: Agora ele vai dar um jeito no Paulo, no Flávio, sei lá.
Quando terminou meu banho, a enfermeira abriu a cortina da frente. Vi que os procuradores desceram da reunião pelo elevador situado no corredor que unia a minha UTI com outra na posição oposta.
Eles estavam todos sorridentes, descontraídos. Mas, não vi Roberto entre eles.
Aproximaram-se da procuradora para conversar. Fizeram uma roda em torno dela. Eu não conseguia entender tudo o que eles falavam. Ela parecia não concordar e eles continuavam argumentando e riam.
Finalmente, consegui ouvir que eles tinham feito um acordo financeiro com a diretoria do hospital. Falavam que receberiam todo mês um determinado valor. A procuradora não concordava, mas acabou sucumbindo.
Eles foram até o Flávio para se despedir. Estavam saindo, voltaram-se para o Flávio e acenaram com a mão um adeus. Foram embora.
O Flávio continuava na postura de dono de bar, sorria aliviado, mexendo a cabeça como se estivesse dizendo sim.
A procuradora sentou-se na cadeira da mesa da Dra. Kátia, reuniu seus pertences e os colocou em sua bolsa.
Olhou para mim, mostrando seu descontentamento, levantou-se, deu um adeus e foi-se embora. 

                                      continua no próximo capitulo

Um comentário:

  1. Aos amigos leitores que leram este texto antes de 23/6/14, comunico que fim uma revisão na passagem sobre o banho na UTI, afim de melhorar a compreensão do evento. Grato

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